Distribuição desproporcional de lucros: há riscos nessa operação?

Recente decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) julgou um caso envolvendo a autuação de um contribuinte pela Fazenda Pública de São Paulo, sob a acusação de que uma distribuição desproporcional de lucros realizada pela empresa, da qual esse contribuinte era sócio minoritário, configuraria uma doação disfarçada, impondo assim a incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).

No caso em análise, o contribuinte autuado e sua irmã seriam apenas sócios minoritários da empresa possuindo apenas 1% do capital cada um, sendo que os sócios majoritários eram os pais dos minoritários e que detinham 98% do capital da sociedade. Porém, ao decidir a distribuição dos lucros, apenas 10% do valor foi destinado aos sócios majoritários, sendo que 90% dos lucros foram distribuídos aos filhos minoritários. Após essa distribuição, os filhos foram eleitos administradores da sociedade, tendo ainda os pais, então sócios majoritários, doado a totalidade de suas quotas aos filhos, reservando para si o usufruto vitalício sobre as quotas doadas.

Assim, a fiscalização estadual entendeu que a distribuição desproporcional de lucros, seguida da doação das quotas, configurava uma simulação para evitar o pagamento do ITCMD, uma vez que não havia uma justificativa negocial para a distribuição desigual dos lucros, lavrando assim o Auto de Infração para cobrar o ITCMD sobre os valores que, segundo o Fisco, deveriam ter sido distribuídos aos sócios majoritários.

O contribuinte, inconformado, impetrou Mandado de Segurança, buscando afastar a cobrança do ITCMD ou, alternativamente, reduzir a multa aplicada. O Juízo de primeira instância concedeu parcialmente a segurança, mantendo a incidência do ITCMD, mas limitando a multa a 100% do valor do tributo devido.

O TJSP, ao analisar o caso em sede de Apelação, manteve a decisão de primeira instância, negando provimento ao recurso do contribuinte. O Tribunal entendeu que, apesar de a legislação permitir a distribuição desproporcional de lucros, no caso concreto, não havia uma razão negocial que justificasse tal distribuição, mas sim a intenção de transferir patrimônio aos filhos de forma gratuita, configurando uma doação disfarçada, caracterizando-se, portanto, como uma liberalidade, ou seja, uma doação sujeita à tributação pelo ITCMD.

Este caso demonstra a importância crucial de um planejamento societário e tributário bem estruturado. Operações societárias complexas, como a distribuição desproporcional de lucros e a doação de quotas, exigem uma análise cuidadosa das implicações fiscais e societárias, bem como a elaboração de uma estratégia que esteja em conformidade com a legislação e que possua uma justificativa negocial sólida.

Uma operação societária mal arquitetada pode gerar diversos riscos, tais como:

  • Autuações Fiscais: Como no caso em análise, a Receita Federal e as Fazendas Estaduais podem questionar operações societárias que aparentem ter como objetivo principal a elisão fiscal, ou seja, a redução indevida da carga tributária. As autuações fiscais podem resultar na cobrança de impostos, multas e juros, onerando significativamente o contribuinte.
  • Litígios Judiciais: As autuações fiscais podem levar a litígios judiciais longos e custosos, desgastando a empresa e seus sócios.
  • Responsabilização dos Administradores: Em casos de fraude ou simulação, os administradores da empresa podem ser responsabilizados pessoalmente pelas dívidas tributárias.
  • Prejuízo à Imagem da Empresa: A divulgação de autuações fiscais e litígios judiciais pode prejudicar a imagem da empresa perante seus clientes, fornecedores e investidores.

 

CONCLUSÃO

No caso em questão, a ausência de uma razão negocial para a distribuição desproporcional de lucros foi determinante para a decisão do TJSP. Se a empresa e seus sócios tivessem demonstrado que a distribuição desigual dos lucros estava relacionada a uma contraprestação específica dos filhos, como a prestação de serviços relevantes à empresa, ou a um investimento estratégico, a situação poderia ter sido diferente.

Operações societárias complexas demandam um planejamento tributário adequado, com uma justificativa negocial sólida, de forma a otimizar a carga tributária dentro dos limites da lei, evitando assim autuações fiscais como essa. Por isso, a assessoria de profissionais especializados em direito societário e tributário é fundamental para evitar riscos e garantir a segurança jurídica das operações.

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